Os Vinhos da Cata
Liberdade para os vinhedos, cuidado com as particularidades de cada terroir e colaboração com os produtores fazem a marca de vinhos do trio de jovens sócios conquistar um lugar próprio na cena enogastronômica brasileira.
Blend da região chilena de Itata: descobertas (foto divulgação)
Digamos que eu já tenha pensado em produzir vinhos. Imaginei que viveria em uma região remota e sofisticada, com denominação de origem, em uma propriedade onde poderia mirar, do alto da colina, meus vinhedos coloridos e perfumados. Depois, como um milagre, veria nascer, do meu desejo, vinhos nobres e perfeitos, engarrafados com o rótulo Carlota. Um sonho.
O trio André, Eduardo e Luca nem perdeu tempo sonhando: quando os três decidiram produzir vinhos, foram à cata de terroirs que lhes fizessem vibrar a alma, buscaram os produtores com quem formar parcerias e selaram contrato para a vinificação em uma estrutura já existente, formatada para esse modelo de negócios. Sem vinhedos próprios, sem a construção arrastada e dispendiosa de uma indústria, mas com propósito e determinação, esses talentosos e entusiasmados moços criaram a Cata Terroirs — eles estão produzindo vinhos únicos de diferentes terroirs, valorizando a origem e a melhor expressão de cada safra.
“O tempo é para o vinho: ouvimos o que ele tem a dizer e apreciamos o processo”, explica Edu, enólogo que encanta com a paixão que revela em seu dia a dia nos vinhedos — de igual tamanho do seu conhecimento e experiência. Eduardo Strechar é formado em Viticultura e Enologia na Austrália e muito jovem já estava em campo pelo mundo, trabalhando no Chile, na Itália até se fixar de volta no Brasil, na região vinícola de Santa Catarina. André é enófilo, sócio investidor, e está no Rio de Janeiro. Luca Fumagalli é um gaúcho erradicado em Curitiba e Florianópolis, uma cabeça com os pés no chão, os olhos no futuro e a taça na mão, percorrendo o mercado com uma estratégia firme e serena para servir os vinhos nas boas mesas da gastronomia. Cata é a forma carinhosa de chamar os nascidos em Santa Catarina; é também a expressão, em português, de caçar, procurar — essência da marca — e cata é, ainda, degustar, em espanhol.
Edu nos vinhedos (foto divulgação)
Luca no mercado (foto Nakayama)
Tudo alinhado, o projeto iniciou em 2019, com as primeiras garrafas lançadas no mercado em 2020. A Cata hoje tem pelo menos 13 vinhos diferentes produzidos em vinhedos de Urubici, São Joaquim e Urupema, nas altitudes máximas de Santa Catarina), em Bento Gonçalves e Vacaria, também regiões altas no Rio Grande do Sul, e, no Chile, no ainda pouco conhecido (por aqui) Vale do Itata. É dessa região vinícola histórica, um dos berços da produção de vinho no país, conhecida por seus vinhedos antigos, que vêm os varietais País e Cinsault, presentes no blend Itata 2021, junto a uma pequena parte de Syrah. O vinho é bastante complexo, intenso nas frutas vermelhas trazidas pela Cinsault e um toque floral selvagem, marca da variedade País.
Edu carrega o varietal chileno País (foto divulgação)
A Sangiovese está presente em um blend com Cabernet Sauvignon de terroirs de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, safra 2022, onde a maturação em barricas de carvalho francês é feita por 24 meses, cada variedade individualmente.
Os brancos da Cata são sofisticados e elegantes como os tintos e, igualmente, trazem o propósito da marca de surpreender com terroirs e métodos. Assim é com o Gran Cata Alvarinho 2022, a uva de origem ibérica produzida no terroir de Faria Lemos, em Bento Gonçalves (RS), fermentada e maturada por 12 meses em carvalho francês e com uma leve tosta. A sensação é de deslumbre, diante da harmonia dos sabores que destacam pêssego em calda, uma pitada cítrica, baunilha, amêndoas, damasco e mel — incrível! A Viognier da Cata é também uma revelação do terroir em Vacaria (RS), floral e frutado, com acidez viva e equilibrada.
Gran Cata 2022: Alvarinho de terroir brasileiro (foto divulgação)
A relação com os territórios é estabelecida em franca colaboração: Edu e Luca são parceiros dos pequenos produtores em cada terroir, trocando conhecimento, experimentando práticas e provando os vinhos. “Queremos ter a melhor matéria-prima e produzir bons vinhos”, conta Edu. Para ele, a variedade de terroirs assegura a diversidade de produtos e oferece segurança de obter insumos de qualidade, diante das alterações climáticas que atingem todas as áreas. E Luca ressalta, ainda, a mínima intervenção humana nos territórios, “ela está nos processos, que definem o vinho” — conclui.
Luca e o filho Nico no vinhedo (foto arquivo pessoal)
Liberdade e cuidado: assim pode ser traduzida a relação com o tempo e o espaço que os empreendedores da Cata Terroirs estabelecem para produzir os vinhos com personalidade, bom gosto e originalidade. Os próximos territórios estão por vir, é bom ficar de olho, taças na mão. Salud!